2012-11-21

O Estado Social na Semana Social

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A Semana Social 2012, que tinha escolhido para tema central, há quase dois anos, "Estado Social e Sociedade Solidária", caiu felizmente em cima de um importante debate na sociedade portuguesa.
A Igreja, que também somos nós reunidos nesta Semana Social, não terá nada mais a dizer no momento em que se debate a reformulação do Estado Social? Os princípios da solidariedade e da subsidiariedade, que norteiam a Doutrina Social da Igreja, como e em que é que inspiram este debate?
Tenho defendido o reforço tanto de um Estado mais sóbrio e inteligente, como de uma sociedade mais poderosa e solidária. O Estado não pode nem deve continuar a crescer para além do que é possível e razoável pagarmos, nem deve crescer em distância, anonimato, burocracia, ineficiência e ineficácia, em qualquer um dos domínios da sua intervenção; naqueles em que os cidadãos e as instituições autonomamente se organizam, devem ser estes e estas prioritariamente a conceber e resolver o necessário apoio social, sustentado na proximidade, no reconhecimento, na relação, na rapidez e na qualidade da resposta.
Precisamos de um Estado mais sóbrio, que entra apenas em subsidium (apoio) dos cidadãos e das suas organizações, visando sempre o seu empowerment. Quanto mais os cidadãos e as suas instituições forem livres, autónomos e responsáveis pelos seus destinos, melhor para a nação e para o Estado que a corporiza.
Fortalecer as instituições autónomas, destinadas a servir a "cidade" e verdadeiramente livres da intromissão do Estado, organizar e fortalecer a rede das pessoas e das organizações sociais que já apoiam os cidadãos e os encaminham para mais autonomia e mais responsabilidade, essa deveria constituir a prioridade de todos. A sociedade livre, autónoma, responsável e solidária que queremos continuar a construir deve ser, por isso, a principal preocupação do Estado.
Vivemos num contexto de grave crise social, não podemos continuar a responder sempre do mesmo modo aos apelos da vida e do mundo. Temos de ir mais ao fundo, porque esta crise tem sinais de que veio para durar, é internacional e vai provocar convulsões e conflitos com várias faces, que afectarão sobretudo os mais pobres, os mais frágeis e os que sofrem. A nossa atenção tem de redobrar! A luz que dizemos que levamos connosco tem de ser colocada em cima da mesa! Os pobres, os frágeis e os que sofrem são, de facto, o nosso critério de acção, o nosso foco e a nossa luz!
A caridade, de que alguns duvidam, em cima de um pedestal, é essencial para dar o pão a quem não o tem e a tranquilidade a quem sofre, em vez de cada um permanecer na sua verdade e prosseguir o seu caminho e a sua retórica, passando ao lado e virando a cara à pessoa aflita. A proximidade e a assistência imediata são, pois, fundamentais. Esse é um lugar donde não podemos sair, digam o que disserem.
A injustiça social que se esconde atrás da miséria exposta tem de ser combatida estrutural e radicalmente, aí mesmo na sua raíz, visando secar lentamente a fonte do seu mal. Temos visto crescer e agigantar-se uma economia que se subordina ao máximo lucro de poucos, quando se devia subordinar à promoção do bem comum e à promoção de uma vida decente para todos e para cada cidadão. É preciso mudar este rumo exclusivista e excludente da economia e da organização do trabalho. O desemprego de tantos é evitável e o trabalho para todos é possível, desde que organizemos crescentemente a sociedade segundo o valor da dignidade de cada pessoa e em torno de uma acção sociocomunitária e solidária.
Na economia e no trabalho, como em outras áreas, impõem-se vários combates sociais e políticos, nos mais variados campos da sociedade e do Estado. Vamos ter connosco, nesta Semana Social, várias iniciativas que caminham neste sentido, com determinação, uma pequeníssima amostra do tanto que já se faz por todo o país e pelo mundo. Há um desenvolvimento social novo que está a proliferar e que é preciso trazer à luz do dia: esse que não elege a economia como o centro da reflexão e da acção política, mas a pessoa, o rosto digno de cada pessoa; esse que se funda na cooperação entre os cidadãos e as suas organizações; esse que fortalece redes de entreajuda e recusa a exclusão social, em cada comunidade local; esse que promove todos os dias o empowerment daqueles que hoje não reúnem as condições de autonomia e responsabilidade, para que as alcancem quanto antes; esse que aposta na frugalidade e na sustentabilidade ambiental, combatendo o actual consumismo descabelado; esse que recusa o assistencialismo paternalista seja do Estado seja das organizações sociais solidárias; esse que percorre caminhos árduos de inovação social com a coragem dos navegadores; esse dos que promovem a paz e incentivam o silêncio, no meio do ruído mais ensudecedor; esse que aposta na participação dos cidadãos no espaço público, nas pequenas e nas grandes decisões, que incentiva e valoriza a democracia da deliberação e não apenas a democracia da representação.
Como cristãos, não passemos ao lado desta Semana Social. Participa e, se não puderes vir, envia o teu contributo para: rita.afonso@semanasocial.pt