© Omar Cleunam
O valor de uma coisa tem a ver com a sua utilidade? E se falássemos um pouco, entre nós, sobre a utilidade do inútil? E também da inutilidade de tanta coisa supostamente tão útil? Caminhamos para um deserto do mundo espiritual, sob o pretexto da acumulação de riquezas e da maximização do lucro a qualquer preço. Vivemos num tempo vergastado pela obsessão pelo dinheiro e pelo ter. É nos momentos de maior crise económica que urge falar da urgente sede do inútil, em todo o lado visível, quando por todo o lado nos fazem crer que viver é ser produtivo, competitivo e consumidor, além de contribuinte. Ionesco disse que "se não se compreende a utilidade do inútil, a inutilidade do útil, não se compreende a arte". E continua: a poesia, a necessidade de imaginar, de criar, é tão fundamental como a de respirar. Adentrar-se no "reino subtil" do inútil é saborear a utilidade da vida, da criação, do amor, do desejo, de um beijo; é a arte, a literatura e a liberdade, é a compaixão, a solidariedade e a gratuitidade de tantos gestos, é a bondade e a beleza, é o que realmente preserva a memória da humanidade do humano. Podemos ter duas opções, segundo Italo Calvino. Uma consiste em aceitar fazer parte do (deste) inferno sem o querer sequer ver. A outra, mais arriscada, consiste em procurar, no meio do inferno, o que não é o inferno e fazer isso durar e dar-lhe um lugar. Porque não criar obras inúteis, redigir notícias inúteis, emitir telejornais que não sirvam para nada? Porque não debater publicamente assuntos inúteis? Se não conhecemos a importância do inútil, como poderemos saber o que é útil?Que tal falarmos sobre isto mesmo? | JA
O valor de uma coisa tem a ver com a sua utilidade? E se falássemos um pouco, entre nós, sobre a utilidade do inútil? E também da inutilidade de tanta coisa supostamente tão útil? Caminhamos para um deserto do mundo espiritual, sob o pretexto da acumulação de riquezas e da maximização do lucro a qualquer preço. Vivemos num tempo vergastado pela obsessão pelo dinheiro e pelo ter. É nos momentos de maior crise económica que urge falar da urgente sede do inútil, em todo o lado visível, quando por todo o lado nos fazem crer que viver é ser produtivo, competitivo e consumidor, além de contribuinte. Ionesco disse que "se não se compreende a utilidade do inútil, a inutilidade do útil, não se compreende a arte". E continua: a poesia, a necessidade de imaginar, de criar, é tão fundamental como a de respirar. Adentrar-se no "reino subtil" do inútil é saborear a utilidade da vida, da criação, do amor, do desejo, de um beijo; é a arte, a literatura e a liberdade, é a compaixão, a solidariedade e a gratuitidade de tantos gestos, é a bondade e a beleza, é o que realmente preserva a memória da humanidade do humano. Podemos ter duas opções, segundo Italo Calvino. Uma consiste em aceitar fazer parte do (deste) inferno sem o querer sequer ver. A outra, mais arriscada, consiste em procurar, no meio do inferno, o que não é o inferno e fazer isso durar e dar-lhe um lugar. Porque não criar obras inúteis, redigir notícias inúteis, emitir telejornais que não sirvam para nada? Porque não debater publicamente assuntos inúteis? Se não conhecemos a importância do inútil, como poderemos saber o que é útil?Que tal falarmos sobre isto mesmo? | JA